Diferentes setores da saúde vêm ganhando eficiência com a utilização da robótica, melhorando os atendimentos, as cirurgias e a gestão hospitalar
A Engenharia Biomédica tem se consolidado como um dos pilares do avanço tecnológico na saúde, especialmente com a introdução de robôs colaborativos em diversas frentes médicas. Seja na realização de cirurgias minimamente invasivas, na reabilitação de pacientes, na automação hospitalar ou na gestão de insumos e medicamentos, essas tecnologias vêm ampliando a precisão dos procedimentos e otimizando a assistência clínica.
No Brasil, universidades, centros de pesquisa e hospitais de referência já incorporam essas soluções, contribuindo para maior eficiência e segurança nos atendimentos. No entanto, a dependência de tecnologia importada, a falta de políticas públicas de incentivo e os desafios na capacitação de profissionais ainda limitam a adoção em larga escala dessas inovações.
Inovação e aplicações clínicas
Os robôs colaborativos na saúde vão além da cirurgia robótica e incluem aplicações no diagnóstico, na reabilitação e no suporte a pacientes com deficiência. De acordo com Antonio Adilton Oliveira Carneiro, Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Engenharia Biomédica (SBEB), o Brasil tem investido no desenvolvimento de sistemas que utilizam braços robóticos para guiar procedimentos complexos, como terapias de neuroestimulação por pulsos magnéticos e ultrassônicos. “Vários centros de Engenharia Biomédica no Brasil estão empenhados na robotização de intervenções cirúrgicas, bem como de atividades colaborativas no diagnóstico e terapia clínica”, explica. Em Ribeirão Preto, grupos como o BIOMAG e GIIMUS têm explorado essa tecnologia para tratamento de distúrbios neurológicos.
Na prática cirúrgica, a introdução de sistemas robóticos avançados tem ampliado a precisão dos procedimentos, permitindo cirurgias menos invasivas, com menor trauma cirúrgico e recuperação mais rápida. O robô Da Vinci, por exemplo, já é amplamente utilizado no Brasil em especialidades como urologia, ginecologia, cirurgia torácica e cardíaca. Hospitais como o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP e o Albert Einstein já contam com robôs específicos para cirurgia ortopédica e endovascular.
Fora do centro cirúrgico, os robôs colaborativos também estão ganhando espaço na automação hospitalar. Já existem sistemas responsáveis por separação e distribuição de medicamentos, garantindo maior segurança no manuseio de fármacos e otimizando processos internos. O Gerente Médico da Cirurgia Einstein, o Dr. Bruno F. Müller, explica que atualmente, “temos robôs que auxiliam na separação de materiais e medicamentos, além de um sistema que distribui fármacos diretamente nas unidades do hospital, reduzindo erros e tornando a operação mais eficiente”.
Na área da reabilitação, os robôs têm sido fundamentais para pacientes com dificuldades motoras. Equipamentos como o Lokomat, utilizado para o treinamento de marcha, são exemplos de como essas tecnologias podem auxiliar pessoas com deficiência física a recuperar a mobilidade. Segundo o Dr. Mário Rino Martins, Cirurgião Oncológico e Coordenador do Programa de Treinamento de Cirurgia Robótica do Real Hospital Português, em Recife, novas soluções estão sendo desenvolvidas para suporte a pessoas idosas e pessoas com deficiência, incluindo robôs assistivos para locomoção e cuidado. “Já temos robôs como o Robear, que ajudam no transporte de pacientes acamados, e sistemas que estão sendo usados na fisioterapia assistida, otimizando os protocolos de reabilitação”, explica.
Além disso, os robôs colaborativos vêm sendo incorporados à gestão hospitalar. “Hoje, há robôs que automatizam a obtenção e análise de imagens radiológicas e processam amostras laboratoriais, acelerando diagnósticos e reduzindo a sobrecarga dos profissionais de saúde”, destaca Martins. Ele acrescenta que a transcrição automatizada de anamneses, organização de dados e agendamentos de consultas são áreas em que a inteligência artificial e a robótica têm reduzido o tempo gasto com tarefas administrativas, permitindo que médicos foquem no atendimento ao paciente.
Desafios e oportunidades para Engenheiros Biomédicos
Apesar dos avanços, a adoção da robótica colaborativa na saúde brasileira ainda enfrenta barreiras estruturais e regulatórias. A principal delas é a falta de uma indústria nacional consolidada na área de robótica médica, o que leva o país a importar quase todos os dispositivos disponíveis no mercado.
“No Brasil, toda a tecnologia de braços robóticos colaborativos é importada. Não temos tradição na criação desses robôs, o que dificulta a transição para usos médicos”, afirma Gustavo José Giardini Lahr, Professor Assistente da Engenharia Biomédica do Hospital Israelita Albert Einstein. Ele ressalta que, apesar disso, pesquisadores brasileiros têm desenvolvido estudos promissores na área, com potencial para impulsionar a nacionalização da tecnologia.
Outro grande desafio é a capacitação de profissionais. No início da introdução da cirurgia robótica no Brasil, o treinamento era realizado exclusivamente pelos fabricantes dos equipamentos. Hoje, hospitais de referência como o Einstein e o Real Hospital Português estruturam programas de especialização que envolvem não apenas médicos, mas também enfermeiros, técnicos e engenheiros biomédicos. “Com o avanço das tecnologias, é fundamental que todo o staff hospitalar esteja plenamente capacitado, pois os robôs colaborativos impactam diferentes áreas da assistência à saúde”, afirma Müller.
A falta de incentivos governamentais também limita o desenvolvimento do setor. Segundo Carneiro, “infelizmente, não existem políticas públicas para estimular a criação de tecnologias robóticas para uso clínico no Brasil”. Ele destaca que a incorporação de robôs no SUS poderia estimular a inovação e impulsionar a indústria nacional. “O Brasil tem engenheiros e pesquisadores altamente capacitados, mas sem incentivos para pesquisa e desenvolvimento, ficamos reféns da tecnologia importada”, avalia.
O futuro da robótica colaborativa na saúde
Mesmo diante dos desafios, o Brasil tem potencial para se tornar uma referência no desenvolvimento de robôs para a área médica. A integração entre Engenharia Biomédica, Inteligência Artificial e Automação abre caminho para novas aplicações, especialmente nas áreas de reabilitação, diagnóstico e assistência hospitalar.
“A robótica colaborativa está cada vez mais focada em suprir demandas específicas em áreas como fisioterapia e terapia ocupacional”, explica Lahr. Segundo ele, a tendência é que novos robôs sejam desenvolvidos para gamificar o processo de reabilitação, aumentando a adesão dos pacientes aos tratamentos e reduzindo a carga física dos terapeutas.
A evolução da robótica médica também passa pela introdução de robôs humanoides na assistência hospitalar. Algumas empresas internacionais já estão investindo em sistemas que auxiliam diretamente no atendimento ao paciente, o que pode se tornar realidade no Brasil nos próximos anos.
Diante desse cenário, a Engenharia Biomédica se fortalece como peça-chave para a inovação na saúde, conectando a pesquisa tecnológica à prática clínica e impulsionando a transformação digital no setor. Se houver investimentos estratégicos e ampliação da capacitação profissional, os robôs colaborativos podem se tornar ainda mais presentes na medicina brasileira, trazendo mais eficiência, segurança e qualidade no atendimento aos pacientes.